Para o ex-ministro e filósofo Roberto Mangabeira Unger, a esquerda brasileira enfrenta uma crise de interesses e objetivos, reflexo de uma mudança estrutural que também pode ser observada em outros países ao redor do mundo.

Durante participação no CNN Entrevistas, Unger avaliou a mudança de rumo do espectro político ao longo dos tempos e apontou uma diminuição de contrastes entre conservadores e progressistas.

“Os conservadores são os que imaginam que é natural que a vida humana seja pequena, há só uma pequena elite de inovadores, heróis, grandes inventores e disruptores, isentos deste destino da pequenez. Os progressistas são aqueles que acreditam que não é natural que a vida humana seja pequena, que nós podemos todos nos engrandecer desde que nos engrandecemos juntos”, afirmou o ex-ministro.

Para o filósofo, a atuação de conservadores e progressistas nas grandes economias do mundo tem demonstrado mais semelhanças do que diferenças, ainda que sejam considerados adversários políticos.

“A grande maioria dos chamados progressistas, na verdade são conservadores. São pessoas que dizem que a verdadeira mudança seria a revolução cultural, a substituição de um capitalismo pelo socialismo, para usar as categorias marxistas. Como isso não é possível – ou se fosse possível seria perigoso demais – o que nos resta fazer é humanizar o mundo”, declarou.

Na avaliação de Mangabeira Unger, os últimos governos brasileiros se limitaram à implementação de políticas financistas e ao que classifica como “pobrismo”. As escolhas, de acordo com o professor, foram as mesmas nas gestões de Lula e Jair Bolsonaro.

“Nas últimas décadas no Brasil, dos governos de Lula e Dilma e Bolsonaro, e antes mesmo, de Fernando Henrique Cardoso, o país esteve dominado pelo financismo. De um lado o financismo fiscalista e de outro lado o pobrismo, a ideia de distribuir as sobras aos pobres, é isso que dominou. E é o casamento do pobrismo com financismo que tem conduzido o Brasil, infelizmente”, afirmou o ex-ministro.

Mangabeira criticou ainda a implementação de políticas públicas que, ao seu ver, não sustentariam um verdadeiro desenvolvimento social do país.

“O nosso país é uma das sociedades mais desiguais na história da humanidade, mas o nosso problema maior hoje não é a desigualdade, é a mediocridade. Nós estamos naufragando, nós estamos afundando no mar de mediocridade e a forma econômica da mediocridade é o primarismo produtivo. O grande recurso do Brasil é a sua vitalidade, o seu dinamismo, uma vitalidade anárquica e quase cega. E essa vitalidade é desperdiçada sem que a maioria dos brasileiros consiga transformar isso em dinamismo. Essa tem sido a nossa tragédia”, avaliou Mangabeira.

O ex-ministro criticou disputas políticas apenas concentradas em questões morais e simbólicas. E defendeu maior acesso ao conhecimento e a capacitação aos brasileiros.
“Acho que a maioria do país não quer ser uma horda de beneficiários cooptados. Quer ser um grupo de cidadãos, de agentes empoderados. O brasileiro agora busca empoderamento. A oportunidade busca a capacitação. Essas esmolas são aceitas se faltam os instrumentos da capacitação, mas não é verdadeiramente o que quer o povo brasileiro. E isso não é só um problema da chamada esquerda. Também é um problema da direita”, completou.

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